qua, 30 de outubro de 2024

Variedade Digital | 26 e 27.10.24

De Lá, Pra Cá | Oi, tudo bem?

Sempre me questiono sobre o porquê de saudarmos alguém com essa frase. Sim, porque é uma saudação. Quando cruzamos com alguém rapidamente no elevador, ou enviamos um recado de WhatsApp e dizemos “tudo bem?”, não estamos realmente perguntando se está tudo bem, mas sim cumprimentando a pessoa. Já notaram? Além disso, essa pergunta não dá muita opção de resposta. Ela é uma pergunta tendenciosa. A resposta automática é “tudo bem, sim, e contigo?”, e qualquer coisa diferente disso é esquisito.
Imagine que, em vez da habitual resposta, o outro resolva dizer: “olha, no aspecto profissional está tudo maravilhoso, mas no lado sentimental, nem tudo está tão bem assim”. O que aconteceria? Na minha cabeça, uma pausa dramática, com close na expressão de assombro de quem recebeu a resposta. Não era aquilo que era para acontecer! A bola do “tudo bem” havia quicado em um lado da quadra, e agora deveria quicar em outro, e fim da história, mas agora quem respondeu estava praticamente convidando o outro para perguntar mais e, talvez, ainda discutir o assunto. E agora? Como saio dessa?
Claro que muitas vezes perguntamos com a real intenção de conhecer a condição do outro (pretensão normalmente percebida) e, se formos próximos de quem perguntou, já temos mais liberdade de responder como quisermos, mas, no resto (e maioria) do tempo, já que não sabemos mais usar o “oi” sem o “tudo bem?”, não estamos perguntando nem respondendo nada.
Vale lembrar que já influenciamos até nossos hermanos fronteiriços, que usam o “todo bien” por nossa conta. O inglês é um pouco mais “ousado”: ele atreve-se a dar respostas que não sejam “estou bem, obrigada” (o “I’m fine, thank you, and you?” que aprendemos na escola é um mito), e diz coisas como “I’m ok” (resposta neutra: não está nas nuvens, nem está mal), “not so bad” (literalmente seria “não estou mal”, mas se traduziria como “estou razoavelmente bem”) e até “I’ve been better” (“já estive melhor”). Dá para acreditar?
Uma russa que mora no Brasil, conhecida minha, postou esses dias em seu Instagram: “É a quantidade de “bom dia! Tudo bem?” por dia. Não quero que me saúdem quando entro numa loja, não quero que me perguntem se estou bem quando entro no Uber, não quero saudar garçom. Sim, não quero. Eu não espero que vocês vão me entender, somente estou contando como é diferente para mim aqui.” E aí você consegue imaginar como é lá para cima.
A verdade é que, por alguma razão, substituímos o “oi” (e somente o oi), o “bom dia”, o “boa tarde” ou até o “preciso falar com você” pelo “oi, tudo bem?”. Apesar de eu própria me pegar usando essa expressão várias vezes por dia (e achar curioso a cada vez), não tenho nenhuma pretensão de mudar a língua, mas que eu acredito que nosso diálogo poderia ser um pouco mais sucinto e levemente mais direto ao ponto, principalmente com tantos meios de comunicação a nosso dispor e tantas conversas brotando deles, ah, isso eu acredito.