Buenas!
O que mais ouvi na semana que ora se encerra é: – QUE CALOR INSANO! Bem, na verdade, o “insano” foi por minha conta, sempre fui exagerado, com este calor, fiquei um tanto mais. Não há brasileiro que não esteja reclamando desta onda, mais uma, de calor fora do normal.
E aqui me apego a outra palavra: normal. Dedicar-me às palavras não o faço por acaso, afinal, delas me alimento vez ou outra. Como disse um dia Drummond no belíssimo poema O lutador: “Lutar com palavras é a luta mais vã! Entanto lutamos, mal rompe a manhã.”
Não quero aqui me comparar com o bardo mineiro, mas, como ele foi, também sou funcionário público e me divido entre as tarefas que pagam as contas e o embate com as palavras, que alimentam uma alma insaciável pelo embate que só a linguagem proporciona.
Mas não era disto que queria falar, apesar de o fazê-lo, mas sim, quero tratar do vilipêndio ao qual a palavra “normal” é sujeita diariamente, tanto na mídia quanto nas redes sociais. O clima que estamos enfrentando nos últimos anos, especificamente neste ano, é normal ou não? Afinal, o que é normal na terceira década do século XXI?
Como é percebido por todos que andam prestando atenção ao seu redor, o normal está sendo relativizado em todos os ambientes, tanto no vestuário, quanto no comportamento humano. Estendendo esta leitura para as questões climáticas, o que é normal? Já comentei outrora sobre as mudanças climáticas às quais enfrentamos sem defesa, mas o assunto é interminável.
Tornado, por exemplo, é uma palavra que eu cresci vendo em filmes americanos, nunca no noticiário local gaúcho. Agora, tornado tornou-se normal em nosso vocabulário. Assim como o calor amazônico que enfrentamos, mesmo vivendo a milhares de quilômetros da floresta mais úmida do mundo, aliás, o Brasil todo está sofrendo com a mesma onda.
Os climatologistas dizem que, neste ano, há alguns agravantes, como o El Niño. Mas ele já esteve por aqui antes? Por que agora ele está atropelando a América do Sul? Será que o desmatamento desenfreado das últimas décadas não está ajudando a esparramar o calor amazônico?
E o El Niño não explica o calor de 50º celsius no meio do ano na Europa, menos ainda o calor fora do normal no Alaska e na Sibéria. Estamos vivendo tempos fora do normal? Ou esse é o novo normal climático?
É mais ou menos disto que tratou o povo que esteve na COP 28. A Conferência de Mudanças Climáticas da ONU perdurou por quase quinze dias, reunindo quase duzentos países em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
A resolução final publicada esta semana propõe que, até 2050, todos os países devem fazer a transição dos combustíveis fósseis, além de propor que seja triplicada a capacidade de energia renovável até 2030. Resolução interessante, pode salvar a humanidade a longo prazo. Bora levantar as mangas e botar em prática?
Peraí: como vamos fazer isso tudo?, perguntam os presidentes de Nauru e de Tuvalu, dois dos países do Oceano Pacífico, dos menores do mundo, ameaçados de ficarem submersos ainda na metade deste século.
Pergunto também, não com a mesma relevância mas com a mesma dúvida dos presidentes acima: como isso será feito? Não há medidas práticas na resolução da COP 28. Nada que obrigue EUA e China, para citar os dois maiores poluidores do mundo, a meterem a mão no bolso e fazerem o necessário para reduzir as emissões de CO², dentre outros poluentes que produzem com ênfase e profusão.
Então, qual a esperança das propostas darem certo? Saberemos somente na COP 30, que será realizada no Brasil, em Belém do Pará, em 2025. Até lá, as ONGs, os climatologistas e nós, reles mortais, continuaremos a reclamar do calor amazônico em pleno pampa gaúcho, bioma que está se esvaindo em areia, devido às secas repetidas e às inúmeras e intermináveis lavouras de soja.
Nesse meio tempo, podemos requisitar ao Comitê Olímpico Internacional que acrescente uma nova modalidade: reclamar do clima! Já que o clima nunca mais estará normal por aqui, teremos muito do que reclamar nos próximos anos…