A recente decisão judicial que manteve a moratória da soja após suspensão temporária pelo CADE representa um marco preocupante na subordinação da soberania nacional e regulatória brasileira aos interesses de organizações não-governamentais internacionais e grandes traders. Este episódio não apenas evidencia a fragilidade institucional do país diante de pressões externas, mas estabelece um precedente perigoso que pode comprometer toda a estrutura produtiva do agronegócio nacional.
Vamos explicar, caros leitores:
A recente decisão judicial que manteve esta aberração jurídica após breve suspensão pelo CADE não é apenas um retrocesso – é a confirmação de que o Brasil permanece, quase duas décadas depois, refém de organizações que jamais foram eleitas, jamais prestaram contas à sociedade brasileira, jamais tiveram autorização constitucional e legal para determinar quem pode ou não produzir em território nacional, jamais plantaram e colheram uma semente sequer.
Durante estes dezenove anos de insegurança jurídica e regulamentar permanente, organizações como Greenpeace, WWF e outras entidades estrangeiras estabeleceram-se como “fiscais” da agricultura brasileira, criando critérios arbitrários que ignoram completamente a realidade agrícola nacional e sua legislação. Enquanto o Código Florestal brasileiro – um dos mais rigorosos do mundo – estabelece regras claras baseadas em décadas de pesquisa científica, estas organizações impõem seus próprios parâmetros através da chantagem comercial exercida sobre traders internacionais.
O resultado, caros leitores, é grotesco: produtores rurais brasileiros que cumprem rigorosamente toda a legislação nacional encontram-se impossibilitados de comercializar sua produção porque não atendem aos caprichos regulatórios de entidades estrangeiras. É como se cidadãos brasileiros fossem julgados não pelas leis de seu país, mas por códigos morais estabelecidos unilateralmente por entidades estrangeiras que operam à margem da legitimidade constitucional e que jamais prestaram contas ao povo brasileiro.
Esta concentração de poder e a uniformização de condutas típico de formação de carteis repousam em berços esplêndidos nas mãos de meia dúzia de corporações estrangeiras, fato que por si só representa uma ameaça direta à soberania nacional, regulatória, alimentar e econômica do país. Os traders não apenas controlam a comercialização, mas ditam as regras de produção, ignorando completamente as instituições brasileiras e tratando o país como uma colônia produtiva subordinada aos seus interesses comerciais.
Dito isso, podemos afirmar que desde 2006, o Brasil vive uma situação constrangedora: um país soberano, com instituições democráticas, sistema jurídico próprio e legislação ambiental rigorosa, submete-se docilmente às imposições de organizações privadas estrangeiras. Esta submissão voluntária representa uma das maiores humilhações da história republicana brasileira. Durante estas quase duas décadas, sucessivos governos assistiram passivamente à erosão da autoridade estatal no setor agrícola.
A moratória não afeta apenas grandes produtores – ela sistematicamente exclui pequenos e médios agricultores do mercado internacional. Produtores familiares que não possuem recursos para custear múltiplas certificações e auditorias impostas por organizações estrangeiras são gradualmente expulsos de cadeias produtivas rentáveis.
A manutenção judicial desta anomalia jurídica estabelece precedentes devastadores para todo o agronegócio nacional. Se ONGs estrangeiras podem determinar regras para a soja amazônica, nada impede que repliquem o modelo para outros insumos, como por exemplo, o milho e o algodão no Cerrado – que aliás, organizações internacionais já articulam moratórias similares para o segundo maior bioma brasileiro; e também na pecuária em todos os biomas, onde o setor enfrenta pressões crescentes por restrições que ignoram avanços tecnológicos, no etanol da cana de açúcar, nos produtos florestais, como madeira, papel, celulose que podem sofrer embargos advindos de algum “estudo europeu”.
O mais preocupante nesta história de dezenove anos de subordinação é a postura pusilânime das instituições brasileiras, onde ministérios, órgãos reguladores, tribunais superiores e o próprio Congresso Nacional assistem passivamente à usurpação de suas competências por organizações estrangeiras – lamentável…
Esta covardia institucional transformou o Brasil no único país do mundo que permite que organizações privadas estrangeiras regulem sua agricultura. Nem países africanos em situação de extrema dependência econômica aceitam tamanha humilhação regulatória. Dezenove anos é tempo suficiente para qualquer experimento regulatório.
A moratória da soja provou ser exatamente o que sempre foi: um instrumento de dominação econômica disfarçado de preocupação ambiental. Sua manutenção judicial representa não apenas um erro jurídico, mas uma traição aos interesses nacionais.
O Brasil não pode aceitar por mais um dia sequer que traders e organizações não governamentais estrangeiras determinem quem pode plantar, onde pode plantar e como pode plantar em território nacional. Infelizmente o Brasil sempre empoderou uma elite política, econômica e ambientalista e esse fato é um impedimento intransponível à democratização da economia de mercado e ao produtivismo includente.
Precisamos resgatar urgentemente nossa racionalidade jurídica e democrática. Políticas que afetam a produção nacional, o produtor rural, o consumidor, devem emanar de instituições democraticamente constituídas, não de lobbies privados disfarçados de um verniz ambiental que de ambiental não tem absolutamente nada.
Crédito dos Autores:
Charlene de Ávila
Advogada. Mestre em Direito. Consultora Jurídica em propriedade intelectual na agricultura de Neri Perin Advogados Associados – Brasília-DF
Néri Perin
Advogado Agrarista especialista em Direito Tributário e em Direito Processual Civil pela UFP. Diretor Administrativo da Neri Perin Advogados Associados – Brasília- DF