sex, 29 de março de 2024

Aplateia Digital | 23 e 24.03.24

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BRASILEIRO NASCEU PARA…

Buenas!

Ele nasceu sob o signo que rege aqueles que farão sucesso na vida! Claro, segundo sua madrinha, que ele viu uma vez só na vida; disse que ele era um predestinado. Nunca aprendeu o significado dessa expressão, mesmo assim, nunca a esqueceu. Sua mãe era bastante atarefada e religiosa; não por isso, demorou anos para registrar os filhos e, quando o fez, todos ficaram com a mesma data de nascimento. Assim, ninguém nunca soube o mês em que ele nasceu e ficamos sem saber qual é esse abençoado período. Esse é Brasileiro de Jesus, o herói dessa história.
Recebeu o escasso leite que sua mãe conseguiu produzir após o sexto parto antes dos trinta. Cresceu sob os auspícios da esperança e em busca do lugar prometido pelas estrelas. Quando estudou, só o fez em escola pública. Se quisessem saber o que é felicidade plena, bastava olhar o jovem na fila da merenda.
Reprovou algumas vezes, até que desistiu. Apesar de saudoso da hora do lanche, obrigou-se a permanecer somente com o trabalho braçal que lhe cabia por herança. Não podia recusar o convite realizado rotineiramente a cascudos por seu pai, afinal, como bom proletário, ele contava com sua prole na labuta diária. Claro, isso até ganhar alguma grana no jogo do bicho e largar a mãe de nosso herói em troca da outra família que mantinha no paralelo há algum tempo.
Realizando pequenos trabalhos braçais, Brasileiro de Jesus chegou à maioridade. Foi selecionado para o quartel como soldado raso. Lá permaneceu alguns anos; quando na hora do rancho, era dos primeiros. O ápice da carreira militar foi quando tornou-se auxiliar de cozinha, onde conquistou sua rotunda circunferência.
Adquiriu e manteve somente um vício desde então: apostas. Tinha fé que seu momento ia chegar, como predisse sua tia. Se não fosse pelo trabalho, seria pela sorte, pois seu pai, que ele nunca mais viu, conseguiu, porque ele não poderia?
Nunca soube como ingressou, também não compreendeu quando o desligaram, recebendo um obrigado e boa sorte. Novamente no mercado de trabalho, fez bicos aqui, outros ali, conseguindo pagar um parco aluguel de pensão na maior cidade do país. Conseguiu seu lugar ao sol quando conquistou um emprego de auxiliar de cozinha em um restaurante frequentado por graúdos, políticos e gente da TV.
Quase não os via, devido à sua posição, como também nunca se envolvia com questões problemáticas. Assistia aos jogos do seu time pela tevê, o mais popular do país, dizia com orgulho, frequentava mensalmente a grande igreja do centro da cidade e lá deixava seu dízimo, não importando se teria o suficiente para encarar o mês, afinal, não podia desapontar o pastor.
Votou em quem tinha de votar, orgulhoso por ter eleito todos os presidentes do país nos últimos 20 e tantos anos. Dizia que tinha sorte nisso, faltava somente sorte no jogo. Apostava em tudo: jogo do bicho, loto, bilhete da loteria esportiva, mega-sena, o que lhe oferecessem. O pouco que ganhava mal dava para a sobrevivência e, com estes gastos extras, estava sempre endividado.
Até que veio a pandemia, que tirou-lhe o emprego e muito da saúde.
Apesar disso, dizia que o vírus era enganação, fabricado em laboratório. Máscara é bobagem, vai me fazer mal; fechar tudo era besteira. Ele sabia disso não porque assistia aos jornais, mas porque assistia vídeos muito sérios no youtube. Acabou por perder o emprego por não usar máscara, uma injustiça, bradava.
Estava em um momento difícil, pouco para comer, muitas reclamações quanto ao sistema dominante, tudo culpa do judiciário, do congresso e poucas soluções. Entretanto, muita fé na sorte e nos dizeres de seus políticos preferidos. Com dívidas altas, mais altas deviam ser as apostas, dizia Brasileiro, sempre sorridente e confiante na virada.
A tosse veio e apossou-se dele, mas pouco lhe afetava. Tomava alguns remédios baratos e eficazes, cujas receitas recebi pela internet, afirmava. Agora, tudo ia mudar. Já tinha em mente os números que iriam faturar o grande prêmio, a maior bolada do ano, o bilhete da virada. Na fila da lotérica, disfarçava a tosse que assolava seus pulmões. Estava de máscara, senão iriam impedir-lhe o acesso. Preencheu um único bilhete com os números associados à data de seu nascimento, conforme sua mãe o registrou. Era pouco o dinheiro que lhe restava, obrigando-o a optar: apostar ou comer. Agora vai, disse enquanto beijava o bilhete, olhar postado nas nuvens, devotamente.
Com o papel no bolso da camisa já surrada e puída, foi encontrado na rua, perto de casa, caído e com dificuldades para respirar. Na emergência do hospital, aguardava sentado em uma cadeira de plástico, pois todas as macas estavam ocupadas. Os médicos atarefados escolhiam os que estavam em pior estado para atender, não por prazer sádico, mas por puro pragmatismo, eram tantos, que o sistema não comportava.
Ele não soube que toda sua roupa foi colocada em um saco e incinerada, evitando novas contaminações, enquanto seu corpo foi encaminhado para o cemitério, enterrado em uma vala comum, pois estava sem documentos.
Brasileiro de Jesus nunca soube que ganhou o grande prêmio daquele ano, do mesmo modo, ninguém nunca soube quem ganhou e não retirou aquele grande prêmio. Infelizmente, nosso herói não nasceu para o sucesso…

Rodrigo Lorenzoni diz que falta transparência e questiona necessidade de aumentar impostos

Os dados divulgados pela Secretaria da Fazenda do RS essa semana mostram que nos dois primeiros meses de 2024, a arrecadação do estado aumentou 24% em relação ao mesmo período do ano passado. Ainda assim, o governador Eduardo Leite tem insistido na necessidade de aumentar impostos,  de forma direta, aumentando a alíquota base do ICMS, ou indiretamente, através das decretos